Novos programas de Educação Financeira têm como base o comportamento do consumidor

Novos programas de Educação Financeira têm como base o comportamento do consumidor

Por Renato Cuenca, presidente da Abrarec (Associação Brasileira das Relações Empresas Clientes)

As relações de consumo no Brasil abarcam uma característica peculiar do ponto de vista da compra voluntária de bens. Não obstante ao fato de produtos e serviços trazerem em seu bojo um apelo funcional, emocional ou social às necessidades de consumo, as decisões de compra tendem a não considerar por completo a capacidade financeira dos consumidores. Concorre para isto o alto grau de endividamento das famílias brasileiras – cerca de 58% se declaram endividadas, um padrão moderado, de acordo com a Confederação Nacional do Comércio –  e a baixa propensão à poupança – em pesquisa recente o Banco Mundial atestou que os poupadores brasileiros representavam 28% da população nacional, metade do percentual verificado em outras economias.

Visando exortar a relevância da formação financeira como via de aculturação do saber lidar com o dinheiro, emergem do mercado – por difusas iniciativas – cursos, programas e portais online de educação financeira. O propósito louvável é o de escrever um capítulo racional no momento das decisões de compra e na otimização do consumo de produtos e serviços, em aceitável ode às relações equilibradas de consumo.

A depender, contudo, dos dados de poupança e do grau de endividamento apresentados, estas iniciativas têm sido insuficientes para ensejar uma relação de consumo satisfatoriamente saudável ao aspecto econômico.

Pesquisas do Banco Mundial que recentemente revisitaram a literatura dos programas de educação financeira atestam que tais iniciativas com foco exclusivamente pedagógico e difundidas em larga escala no mercado não conseguem mudar o hábito das pessoas e que o processo deve considerar outros elementos críticos ao aprendizado, como as diferenças individuais e a necessária mudança de comportamento e o seu aspecto não imediatista.  Os programas de educação financeira que efetivamente se prestem a inserir o conceito econômico nas relações entre consumidor e provedor de produtos e serviços precisam – de forma imperativa – atuar sob o prisma do viés comportamental do consumidor, modulando uma convivência contínua, presente e longeva com este mesmo consumidor, resultando numa efetiva mudança de comportamento na arte de se lidar com o dinheiro. É necessário conhecer na prática as funções diárias deste consumidor a partir de intervenções tópicas em seu modelo de consumir e na sua relação com o dinheiro. Programas de educação financeira que atuem sob frentes multidisciplinares de interpretação e observação do comportamento do consumidor estão na vanguarda deste novo modelo de educação, que sustentará um novo consumidor e uma nova relação de consumo.

Um bom trabalho neste sentido é o Núcleo Interdisciplinar de Educação Financeira criado pela PUC-Rio que, estimulada pela Comissão de Valores Mobiliários, desenhou um programa cujo eixo central está em gerar uma mudança de comportamento do consumidor, atuando na observação, convivência, intervenção em campo e promovendo discussões dirigidas em conjunto com entidades consumeristas e órgãos regulamentares.

Considerando, pois, que os programas de educação financeira tendem a se moldar neste veio, cabe ponderar que um novo padrão de comportamento deste consumidor – então mais preparado e capacitado para tomar decisões de consumo – emergirá. Será mister, da mesma forma, que as organizações se inclinem a compreender quais os produtos e serviços valerão para este novo patamar de relação, mais estável, equilibrada e sustentável.

Os novos programas de educação financeira tendem a criar um novo padrão de consumo e um novo perfil de consciência do consumidor, contribuindo para o exercício da cidadania. Será uma oportunidade adicional para as organizações na árida tarefa de interpretar o consumidor.